Até que um dia descobri...
Há 17 anos, no dia 4 de Julho, morreu o escritor, professor e jornalista português Augusto Abelaira (1926-2003) Natural de Ançã, concelho de Cantanhede, era licenciado em Ciências Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa. Foi professor, tradutor, jornalista no Diário Popular,O Século, cronista em O Jornal e no Jornal de Letras; director de programas da RTP, das revistas Vida Mundial e Seara Nova (1968-69), presidente da Associação Portuguesa de Escritores, mas foi sobretudo como dramaturgo e romancista que o seu nome é mais recordado, apesar de hoje em dia ser pouco lido ou eventualmente desconhecido.
Numa entrevista que deu ao jornal Folha de São Paulo, em Agosto de 1996, e sobre a sua vocação como escritor, Augusto Abelaira confessou que escrevia porque lhe dava "prazer". Começou a escrever "ainda garoto, por imitação. Lia livros do meu pai e queria imitá-los. Depois queria competir com os autores. Não fosse a biblioteca de meu pai, nunca teria escrito.
Comecei escrevendo teatro, sob influência de Marcelino Mesquita, um escritor menor. Fazia versos também. Um dia, o meu pai leu-me um poema do Fernando Pessoa com os versos : "Com que ânsia tão raiva/ Quero aquele outrora!/ E eu era feliz? Não sei:/ Fui-o outrora agora". Esse verso, que não compreendi no princípio, revelou-me uma outra literatura".
Mais tarde, ainda na juventude, no início da II Guerra Mundial (Setembro de 39), disse que ficou fascinado com"um livro de Katherine Mansfield e um do Tchekov, e completou-se a revolução. Mais adiante passei a ler a revista "Presença", que introduziu em Portugal Joyce, Proust, Gide."
Estava lançado para ser escritor, mas "só publicou tinha já mais de 30 anos de idade". Não por culpa própria, reconheceu, mas pela recusa do editor. "Tinha tentado antes, mas o editor recusou. Desisti de escrever, sob o argumento valioso e parvo de que se Dostoiévski e outros já haviam escrito, para que eu iria escrever? Entrei em desespero, até que um dia descobri que nada no mundo me obrigava a escrever como ele, além de que nem só os Dostoiévskis escreveram!"
Augusto Abelaira escreveu muito: centenas de crónicas, 12 romances, peças de teatro... Merece continuar a ser lido.
João Godim
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