As revoluções acontecem
quando as situações são insustentáveis
Durante a Revolução de Outubro de 1917, os bolcheviques derrubaram o governo provisório de Kerensky, que se formou durante a Revolução de Março do mesmo ano. Substituíram-no, então, com um governo soviético, liderando o nascimento da União Soviética.
Cem anos depois, como é que o dia 17 de outubro de 1917 marcou a história? Há muitas teorias. Há muitas ideias. A certeza é que nada ficou igual depois da revolução de Outubro.
O SAPO 24, fez seis perguntas a quatro personalidades entre as quais D. Manuel Clemente (M.C.), Cardeal-Patriarca de Lisboa.
M.C. > "As revoluções acontecem quando as situações são insustentáveis. Assim foi na Rússia em 1917, assolada pela guerra e a fome, com uma população maioritariamente pobre e pobríssima e com um regime anacrónico e insensível.
O grupo determinado que tomou conta do país veiculava uma ideologia de base marxista, tentando implanta-la no último país em que Marx a poderia prever. Com pouca e frágil burguesia e uma industrialização incipiente.
Fosse como fosse, o sistema impôs-se de forma radical e sem contemplações para qualquer resistência que aparecesse. E perdurou depois, cada vez mais drástico durante o estalinismo, especialmente para com os próprios dissidentes. A vitória compartilhada sobre a Alemanha em 1945 reforçou-o na cena mundial. Fora da Rússia, o ideário igualitário que propalava atraía e mobilizava opositores - assalariados, jovens, intelectuais... - de outros regimes, ditos burgueses e capitalistas, onde também não faltavam problemas sociais por resolver.
O que sobra de tal revolução é alguma coisa do ideal que empolgava muitos dos seus protagonistas. Também a desilusão quanto à forma que acabou por ter. E esperemos que o cuidado em fazer muito melhor no futuro, com mais respeito por cada pessoa humana, inultrapassável sempre.
Porque a religião era encarada como cobertura da situação existente, foi duramente fustigada na Rússia, tornando o país símbolo dos "sem Deus". Para os crentes e em especial os católicos, a manifestação sobrenatural de Fátima, nesse mesmo ano acontecida, tornou-se o polo espiritual oposto, e também o novo alento da resistência religiosa. E assim perdurou até ao fim dos anos oitenta"<.